Dona Eliza: a dama do samba belorizontino

Dona Eliza: a dama do samba belorizontino
Reprodução/Elmo Alves

Dona Elisa chega ao nosso sindicato alegre.  Recebe todos com abraços longos. Sua pele negra transpira suas marcas da idade. Cada marca uma história, como ela mesma diz. Até em momentos tristes, conta sua história sorrindo. “Sou o que sou pelo que eu passei, senão eu não seria eu”. Uma das poucas representantes femininas da velha guarda do samba belo-horizontino, Ana Elisa de Souza, a Dona Elisa, completa 72 anos com mais de 700 composições gravadas em mais de 50 anos de vivência com o samba. Empregada doméstica aposentada, filha de pai lavrador e mãe professora, já passou por muitas dificuldades. Começou a cantar bem nova, aos 10 anos no colégio, sendo que aos 15 estava dividindo o palco com os homens que tocavam samba em sua cidade natal, Águas Formosas no norte de Minas Gerais. Aos 17 anos, inicia sua vida na composição e parte para o Rio de Janeiro tentar a vida na arte. Segundo dona Elisa, foi um grande preço a se pagar na vida. Contrariando sua mãe, que não gostou da escolha, ela insistiu para poder viver de suas composições. “Naquele tempo eu cantava mais música da roça, caipira, música mais romântica, mas depois veio o samba e entrou em minha veia”, relembra. — No Rio é que realmente fui conhecer melhor o samba, me encantando com ele, e ainda mais decidida a seguir carreira de cantora e compositora. E falei ‘gente,

parece com a música da minha cidade, só que lá nós chamamos de batuque’ (risos). Só mais tarde é que fui saber que samba e batuque são da mesma família — lembra. A partir desse momento o samba tornou-se o gênero musical preferido de Dona Elisa, que acrescenta a suas composições todas as influências dos batuques da infância. Mas o Rio de Janeiro foi um momento de passagem. Dona Elisa volta a Minas Gerais “por saudade da terra” como bem lembra e se instala em Belo Horizonte. Ao chegar, não foram momentos agradáveis. Morou na marquise do edifício da Rua Curitiba onde ficava a loja Mesbla. Segundo Dona Elisa, este foi o

seu primeiro hotel. Desistir não estava em seus pensamentos. E sempre seguia o conselho da mãe “de não se envolver com coisa errada”, conta sorrindo. Conseguiu um trabalho de doméstica na casa de uma família. Trabalhava de segunda a sábado e aos finais de semana também fazia bico cantando em bares da capital. Foi depois de conhecer José Luiz Alves,

que se apresentava no clube Elite, foi à Ordem dos Músicos do Brasil para tirar sua carteira e começar a atuar em bares e clubes da cidade. Cantou no Elite dentre outras casas um repertório bem variado, que passava a MPB, música raiz, samba, brega… – Foi depois de conhecer o maestro Jadir Ambrósio que eu fui apresentada ao pessoal da velha guarda. Foi ali que

comecei a dedicar mais minha música ao samba, com grandes arranjadores,

colegas de altíssima qualidade. Claro que Dona Elisa precisou vencer

muitas barreiras para se consolidar com suas composições. “Sou mulher em uma sociedade bem machista. Junta com o racismo, eu acabei apanhando de muitos lados para ter o respeito que hoje tenho. Saí de uma casa que eu trabalhava por não aceitar humilhação. Tudo que sou, que tenho hoje, agradeço a Deus que me deu as forças para encarar de peito aberto e cabeça erguida”. Com o passar dos anos, foi se consolidando nas rodas de samba e hoje é tida como referência na velha guarda de Belo Horizonte. Mesmo com mais de setecentas músicas gravadas na voz de outros intérpretes, foi na comemoração de seus 50 anos de carreira que veio à oportunidade de gravar o seu primeiro disco. Diploma da Vida, segundo a própria dona Elisa, é a música que descreve toda sua vida. “Não tenho diploma formal, mas a vida foi a melhor escola que eu tive e sou diplomada nela”. E você, caro leitor, deve estar pensando que erramos ao retratar o nome de Dona Elisa com “S” ao invés do “Z” como no título da matéria. Mas isso

ela mesma explica. “Para não ter problema aceito os dois. A Eliza artista é

com Z, mas o nome original é com S”, finaliza.

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Fontes – Entrevista Dona Elisa, Jornal A

Verdade, Prefeitura de Belo Horizonte.