A Sociedade Brasileira do Espetáculo

Por Gilberto Mauro

Os meios de comunicação exigem uma séria reflexão. A primeira delas é que, apesar de serem uma concessão pública, jornal, rádio e TV sempre trabalharam pelos seus patrocinadores, ou seja, o capital, e nunca tiveram carácter público. Independente das mudanças de suportes, tais plataformas passaram décadas a fio desconstruindo a cultura de um país. Sem a base da cultura, sem identidade cultural, uma nação não pode ter entendimento de si, muito menos do mundo, porque se desconstrói a memória. Assim, se aliena e alija de todo o conhecimento. Neste estado quase mesmerizado, esta enorme multidão absorve, aceita e normatiza uma falsa verdade, por mais aberrante que seja.

Hoje, já perdendo o espaço para os suportes da internet, a imprensa corporativa deixou um imenso legado de desinformação, ignorância e mentira. “Pariu”, assim dizendo, seus processos bestificantes que alimenta parte da sociedade, em especial os setores desprovidos de leitura, de cultura e entendimento crítico. Como em  consequência imediata, vive em ciclos viciosos de consumo de qualquer natureza .. A despeito disso, ficam aqui algumas reflexões do filósofo francês, Guy Debord, em seu Livro escrito nos anos 60 “A Sociedade do Espetáculo”. Tal obra destrincha os processos midiáticos de forma ideológica, psicológica, suas causas e consequências. Profundo, atualíssimo, visceral:

“O movimento de banalização que, sob a diversão furta-cor do espetáculo, domina mundialmente a sociedade moderna, domina-a também em cada ponto em que o consumo desenvolvido das mercadorias multiplicou na aparência os papéis e os objetos a escolher. A sobrevivência da religião e da família – a qual continua sendo a principal forma da herança do poder de classe”.

“Com a separação generalizada entre o trabalhador e o que ele produz, perdem-se todo ponto de vista unitário sobre a atividade realizada, toda comunicação pessoal direta entre os produtores separados e da concentração do processo produtivo, a unidade e a concentração tornam-se atributo exclusivo da direção do sistema. A vitória do sistema econômico da separação é a proletarização do mundo”.

“A origem do espetáculo é a perda da unidade do mundo, e a expansão gigantesca do espetáculo moderno revela a totalidade dessa perda: a abstração de todo trabalho particular e a abstração geral da produção como um todo se traduzem perfeitamente no espetáculo, cujo modo de ser concreto é justamente a abstração. No espetáculo, uma parte do mundo se representa diante do mundo e lhe é superior. O espetáculo nada mais é que a linguagem comum dessa separação. O que liga os expectadores é apenas uma ligação irreversível com o próprio centro que os mantém isolados: O espetáculo reúne o separado, mas o reúne como separado”.

“Se as necessidades sociais da época na qual se desenvolvem essas técnicas só podem encontrar satisfação com sua mediação, se a administração dessa sociedade e qualquer contato entre os homens só se podem exercer por intermédio dessa força de comunicação instantânea, é porque essa ‘comunicação’ é essencialmente unilateral; sua concentração equivale a acumular nas mãos da administração do sistema os meios que lhe permitem prosseguir nessa precisa administração. A cisão generalizada do espetáculo é inseparável do Estado moderno, isto é, da forma geral da cisão na sociedade, produto da divisão do trabalho social e órgão da dominação de classe”.

“O espetáculo é a realização técnica do exílio, para o além, das potencialidades do homem: a cisão consumada no interior do homem”.

Como disse um de nossos diretores, Célio Guiga, “Este golpe foi cultural”.

Porque, afinal, todo golpe é cultural.

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